Legislação brasileira vigente na época limitava o tempo máximo de cumprimento de pena a 30 anos, o que prevê que Chico Estrela seja solto em 2028/Reprodução
Francisco de Assis Pereira, o "Maníaco do Parque", foi condenado a quase 285 anos de prisão por crimes cometidos no fim dos anos 90, quando assassinou sete mulheres e violentou outras nove em São Paulo. A legislação brasileira vigente na época, que limitava o tempo máximo de cumprimento de pena a 30 anos. A partir da vigência do “Pacote Anticrime” (Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019), que ocorreu em 23 de janeiro de 2020, foi estabelecido o patamar de 40 (quarenta) anos como o tempo máximo que um indivíduo pode cumprir pena privativa de liberdade no Brasil.
Diante da legislação anterior, há expectativa de que ele seja solto em 2028. Esse possível cenário trouxe à tona discussões sobre a periculosidade do réu e a capacidade do sistema penal em lidar com casos extremos como esse. O promotor Edilson Mougenot Bonfim, responsável pela acusação no Tribunal do Júri, expôs ao portal Miigalhas, suas reflexões sobre o caso e a legislação penal brasileira.
Mougenot Bonfim é autor de "O julgamento de um serial killer: o caso do Maníaco do Parque" e fundador da Escola de Altos Estudos em Ciências Criminais. Para o promotor, a natureza da psicopatia de Assis revela uma incapacidade de reabilitação. "Não sou eu com opinião pessoal, é a ciência que diz isso; é unânime na psiquiatria mundial que pessoas que sofram desse transtorno de personalidade antissocial, no mais alto grau, como o dele, que torna ele um serial killer, são incorrigíveis, incapazes de aprender pelo exemplo, incapazes de um juízo autocrítico, sincero e, portanto, incapazes de correção."
O promotor ressalta que a periculosidade de Assis só está contida enquanto ele estiver encarcerado. "Hoje ele não apresenta uma periculosidade porque o homem é ele e suas circunstâncias, e ele está preso com todo o policiamento ostensivo, está recluso, mas a partir do momento que, eventualmente, viesse a ganhar a liberdade, a personalidade dele seria a mesma, com o mesmo transtorno, e logo ali estaria presente o mesmo perigo e o mesmo risco", declarou Bonfim.
Segundo Bonfim, o atual sistema penal brasileiro não oferece medidas eficazes para impedir que criminosos de alta periculosidade retornem à sociedade. Ele considera que as mudanças no Código Penal de 1984 foram um "erro gravíssimo", pois substituíram o "sistema duplo binário" - que permitia que o condenado cumprisse uma pena e, caso mantivesse a periculosidade, fosse submetido a uma medida de segurança - pelo "sistema vicariante", onde a escolha é feita entre a pena ou a medida de segurança.
Ele defende que a prisão perpétua seria uma solução mais eficaz para criminosos como Assis, que, segundo Bonfim, não apresentam condições para a reintegração.
Ele enfrentou diversos desafios ao acusar Assis no Tribunal do Júri, incluindo a necessidade de esclarecer o conceito de "serial killer", até então pouco conhecido no Brasil. Para embasar sua atuação, Bonfim se dedicou a estudos internacionais sobre o tema, realizando pesquisas fora do país e se debruçando sobre a literatura psiquiátrica estrangeira. "Eu precisei viajar para vários países e comecei paulatinamente a me imergir numa doutrina e numa literatura que o Brasil desconhecia", relatou.
Outra dificuldade foi corrigir um equívoco linguístico amplamente disseminado pela mídia, que atribuía a Assis o termo "maníaco". "Ao se dizer que alguém é maníaco, leva-se à população leiga a ideia de que alguém é doente e, portanto, isento de pena." Bonfim destacou que o transtorno de personalidade antissocial, apesar de grave, não configura uma doença mental isentadora de pena, segundo o Código Internacional de Doenças.
Recentemente, o caso ganhou repercussão com o lançamento do filme "Maníaco do Parque", no qual o ator Silvero Pereira interpreta o serial killer. Bonfim reconhece o valor do filme para manter a discussão pública sobre o tema, porém, considera que a obra é insuficiente para ilustrar a gravidade dos crimes e a complexidade do trabalho de investigação e julgamento.
O promotor mencionou que, enquanto o longa se foca em personagens fictícios, a realidade dos crimes de Assis e o trabalho de investigação realizados à época eram muito mais impactantes. Contudo, ele reconheceu que o filme desperta um debate importante: a necessidade de repensar medidas legislativas para casos de extrema periculosidade, como o de Assis, onde o promotor vê a prisão perpétua como uma solução mais segura e justa tanto para o réu quanto para a sociedade.
Bnews
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